segunda-feira, 8 de abril de 2013

Objeto


Eu moro numa caixa de plático transparente.
Toda semana saio de casa para trabalhar,
trabalho árduo, contínuo e pesado.

Evito que plantações de alface e couve cresçam 
descontroladamente pelos campos de unha.
Raramente saio do banheiro.

Mas, hoje se procurarem por mim não vão me encontrar.
Estou de férias.
Saí da rotina e do aperto.
Nada mais de pular de dedo em dedo, 
cortando um pedaço aqui e outro ali.

Às vezes penso: Por que ainda não inventaram outro jeito de fazer isso?
Talvez as crianças do futuro já vão nascer de unhas curtas.
Não vão mais precisar de mim.

Seria isso uma evolução da espécie?
Espécie sem unha.
Mas, que diabos é uma unha e por que cresce tão rápido?
Não sei. Ninguém nunca me contou.

Não deve ser coisa boa.
Tem sempre de ser cortada e depois lixada.
Eu conheço a lixa. 
Às vezes, ela fica comigo aqui na caixa.

Conversamos horas sobre a vida alheia.
Falamos da dificuldade que é trabalhar quando tem aquele esmalte
vermelho na unha ou aquela base transparente que nos pega de surpresa.

Não é uma vida solitária.
A pinça também fica na caixa com a gente.
Puxa pelo, mas conversa que é bom, nada!

Mas, voltando à evoluçào da espécie.
Será mesmo que vou perder minha utilidade e
ficar esquecido no canto do banheiro?
Duvido.
Vai ter sempre um pé por aí precisando dos meus cuidados.




Simone Vieira Resende

História da vida real: oficina de memórias.
Estação das letras

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